Definição: alongamento e flexibilidade
Alongamento, flexibilidade: definições e contraposições
Prof. Dr. Abdallah Achour Junior
Universidade Estadual de Londrina - PR
Publicado na revista Brasileira de atividade Física & saúde, v. 12,n.1,2007
Resumo
Este artigo tem como objetivo discutir os termos alongamento, flexibilidade e mobilidade, utilizados na área de educação física e esportes. Na literatura nacional e internacional, alongamento tem sido empregado mais freqüentemente como exercício físico; flexibilidade, como capacidade motora, e mobilidade, como característica de movimento articular; contudo, algumas vezes usam-se esses termos como sinônimos. Uma área de estudo requer conceitos claros e a literatura sendo divergente pode causar distorções teóricas e práticas. Um posicionamento elaborado por especialistas pode ser fundamental para área de educação física e esportes.
Introdução
Definir precisamente um termo não é tarefa fácil. O entendimento do significado de um termo é essencial para o desenvolvimento de uma área de estudo. Provavelmente, na área da educação física e esportes, os termos flexibilidade, alongamento e mobilidade são considerados difíceis de definir.
É comum, no campo profissional, acreditar que alongamento é uma prática de exercício que solicite dos componentes musculares e flexibilidade, uma prática de exercício mais intenso, “ultrapassando os níveis do que se considera alongamento”, e com isso solicite dos componentes articulares. Equívocos com os significados dos termos podem provocar distorções práticas, isto é, se a diferença entre flexibilidade e alongamento fosse a quantidade de tensão de alongamento, pergunta-se como seriam as medidas e interpretações para se saber se utilizou músculos e/ou articulações? Ainda, teria aulas de alongamento e de flexibilidade, uma com intuito de manter e desenvolver a flexibilidade respectivamente? E como se denominaria a capacidade motora?
Este artigo tem por objetivo apresentar e discutir os termos alongamento, flexibilidade e mobilidade, referidos na literatura nacional e internacional, numa tentativa de manifestar um posicionamento na área de educação física e esportes.
Alongamento
É extremamente importante para a educação física brasileira conhecer os termos da área e procurar estabelecer consenso entre eles, ou pelo menos reconhecer suas diferenças nas situações apresentadas. Por exemplo, no livro “Los Estiramientos” elaborado por BLUM (1998), o termo estiramento foi traduzido de “stretching” e significa, segundo o autor, estender, flexibilidade, mobilidade, elasticidade, estirar e alongar, etc. A pluralidade de termos associados por BLUM (1998) não define seu significado e pode repercutir em distorções conceituais ao serem aplicados na educação física e esportes. No idioma francês designam tanto o termo étirements (GEOFFROY, 1998), como elongations (GRAY, 1980) para definirem alongamento.
Em nosso idioma, o termo estiramento não pode ser referido como sinônimo de alongamento, mas sim, como uma pequena lesão muscular (DORLAND, 1999).
Alongamento não se restringe somente a uma propriedade muscular (GAJDOSIK, 2001). A natureza viscoelástica da unidade músculo-tendínea sugere que o alongamento deverá resultar em maior flexibilidade de uma articulação (TAYLOR, DALTON, SEABER & GARRET, 1990). Isto é reforçado por ASTRAND & RODALH (1987) ao observarem que, se fatores limitantes da flexibilidade ocorrerem pela resistência muscular, um exercício que produz alongamento dos músculos resultará em aumento da flexibilidade. Para Dantas (1999), alongamento é empregado para manutenção dos níveis de flexibilidade e flexionamento para desenvolvimento da flexibilidade.
Nos Estados Unidos, emprega-se o termo “Stretching”, traduzido como alongamento, o qual tem como objetivo manter e/ou desenvolver a flexibilidade (HAMBERG, BJORKLUND, NORDGREN & SAHLSDET, 1993). Alongamento é referido por exercício que envolve a aplicação de uma força para superar a resistência do tecido conjuntivo sobre a articulação e aumentar a amplitude de movimento (CONDON & HUTTON, 1987). Nota-se também que as expressões amplitude de movimento e flexibilidade têm sido apresentadas como características de movimento articular (ZILIO, 1994).
Mobilidade
Nas obras em língua alemã (ZILIO, 1994), existem quatro palavras diferentes usadas para expressar flexibilidade: Gelenkigkeit, Biegsamkeit, Beweglichkeit e Flexibilität. Seus significados corresponderiam à articulação, dobrabilidade e, no caso do termo Beweglichkeit, a movimento com dobrabilidade, característica da própria articulação ou, ainda, à movimentação geral de um indivíduo. Nesse contexto, Beweglichkeit refere-se à mobilidade em vez de flexibilidade e Flexibilität, referido como flexibilidade.
Segundo Zilio (1992), a mobilidade, termo utilizado por Weineck (1986), é a capacidade de movimentar-se uma ou mais articulações e não deve ser utilizado como referência à flexibilidade. O movimento articular tem uma zona neutra, com pouca resistência dos tecidos periarticulares, e ao aumentar a movimentação também evolui a tensão viscoelástica (PANJABI, 1992).
De fato, ao se consultar as bases de dados da BIREME e do MEDLINE com uso da palavra chave mobility, os artigos encontrados a descrevem como movimentos em geral ou a capacidade de se mover e não como sinônimo de flexibilidade. Por exemplo, HALAR e BELL (2002) citam que a imobilização dos ossos longos com gesso tem um efeito benéfico sobre a sua consolidação após fraturas; contudo, pode resultar em efeitos indesejáveis tais como contratura, atrofia dos músculos e ossos saudáveis. A restrição no componente articular modifica o componente muscular.
O sistema muscular e articular têm funções dependentes; uma alteração em um deles modifica em maior ou menor grau o outro. Devido a este fato poderia referir-se à flexibilidade como um sistema musculoarticular, mas esta expressão precisa ser mais bem discutida e considerar o componente neural.
Flexibilidade
A flexibilidade apresenta várias definições, a saber: é a capacidade de realizar movimentos em certas articulações com amplitude de movimento adequada (BARBANTI, 2003); o dicionário Dorland (1999) define flexibilidade como a qualidade de ser flexível e facilmente flexionada sem tendência para se romper; segundo HEYWARD (1991), é a capacidade de uma articulação mover-se com facilidade em sua amplitude de movimento.
GAJDOSIK (2001) argumenta que clinicamente flexibilidade é a máxima amplitude articular e representa o maior comprimento muscular. Ela é determinada pelo cálculo de uma força aplicada à amplitude articular alcançada (WRIGHT, NEPTUNE, BOGERT & NIGG, 2000).
De acordo com CORNU, MAIETTI E LEDOUX (2003), a flexibilidade é avaliada ao testar o ângulo articular passivo (rigidez articular passiva) e o ângulo articular alcançado pela contração (rigidez articular ativa), mediante amplo alcance de movimento.
Para LAESSOE E VOIGTH (2004), flexibilidade refere ao grau de mobilidade passiva do corpo com restrição própria da unidade músculo-tendínea ou de outros tecidos corporais. Ela tem sido mensurada pelo alcance do movimento articular e sua alteração tem sido acreditada originar-se da rigidez do tecido. Tanto pelo termo mobilidade passiva como pelo fato de os autores não caracterizarem quais seriam outros tecidos que restringem a flexibilidade, dificulta-se aceitar esta definição.
Assim, a flexibilidade é expressa e testada referente à articulação, o que gera alguma confusão na literatura. Por exemplo, a flexibilidade dos músculos isquiotibiais pode ser referida como o alcance do movimento em flexão de quadril ou extensão do joelho, porque os músculos cruzam duas articulações. Referir flexibilidade a um músculo que não cruza a articulação não permite o entendimento e a diferenciação de qual componente está causando limitação (HARVEY & CRAIG, 2000). Para evitar esse impasse, seria possível inferir que os autores se refiram à flexibilidade como componente da articulação sem excluir os músculos que a envolvem e a conotação que se meça em graus a articulação em vez do comprimento da unidade músculo-tendínea.
Amplitude de movimento
Uma outra definição foi apontada por HOUGLUN (2001), que diferencia a flexibilidade da amplitude de movimento, sendo a primeira dada como a capacidade da unidade músculo-tendínea em se alongar com uma determinada força. E a redução de flexibilidade provoca redução da amplitude de movimento, definindo esta última como a quantidade de mobilidade de uma articulação, determinada pelo tecido mole e estrutura articular. Independente desta tentativa em distingui-las, necessita ser mais bem elucidada a definição de amplitude de movimento para saber se esta pode ser usada como sinônimo de flexibilidade ou não.
HOFFMAN, SHELDAHL, KRAEMER (2002) utilizam amplitude de movimento referindo-se à flexibilidade. Numa percepção diferente, poderia usar-se o termo flexibilidade como um determinante da amplitude de movimento, esta última dependente de fatores climáticos, motivação, lesão etc..
Ao se testar a flexibilidade com finalidade de se realizarem estudos científicos, atribui-se ao desconforto do alongamento o limite da amplitude do movimento. Este limite de amplitude de movimento é considerado como a resistência passiva inicial; maior resistência é registrada com o alcance da amplitude passiva máxima correspondendo ao comprimento muscular máximo (GAJDOSIK, 2001). Definir flexibilidade como amplitude articular máxima é complexo em razão de que, para se conhecer o máximo de resistência de um sistema mecânico, é preciso provocar rompimento da estrutura.
Nota-se também que, em treinamentos em esportes como as ginásticas esportivas, este limiar fisiológico de resistência musculoarticular geralmente não é considerado, porque alguns exercícios de alongamento ultrapassam a sensação inicial de desconforto e resistência musculoarticular.
Na maioria das vezes, a manifestação da flexibilidade durante as habilidades esportivas é diferente do teste de flexibilidade de forma estática. As habilidades esportivas são em grande parte dinâmicas, realizadas com a força dos músculos agonistas e relaxamento dos músculos antagonistas. Os testes de flexibilidade estáticos são realizados pelo alcance de uma posição e permanência por um breve tempo no movimento, pelos quais se determina a flexibilidade. Em geral, os testes de flexibilidade estáticos não solicitam a força dos músculos agonistas.
Outra questão importante e nebulosa consiste na resistência dos componentes musculoarticulares em relação ao aumento da amplitude de movimento. É comum acreditar-se que alcançar uma determinada amplitude do movimento é alongamento, em razão de se utilizarem somente músculos, e ao superar esta amplitude é flexibilidade; entretanto, o alongamento não consiste em utilização exclusiva dos músculos (CUMMINGS, 1984).
Num estudo sobre os tecidos que interferiam prioritariamente na flexibilidade, com nove mulheres entre as idades de 35 e 65 anos, Cummings (1984) constatou que o músculo causou a primeira limitação na extensão do cotovelo, seguido pelos ligamentos. Com a continuidade do movimento, a amplitude seria impedida pelos ligamentos, cápsulas articulares e ossos.
Muitas pesquisas em animais são invasivas, diferentemente da maioria das pesquisas em humanos, feitas indiretamente; em razão disso, os resultados delas com relação à flexibilidade devem ser minuciosamente interpretados, pelas possibilidades de apresentarem respostas diferentes quando forem comparados com humanos.
Uma adequação possível para evitar o impasse terminológico em relação ao uso do termo flexibilidade e alongamento seria substituir a designação exercícios de alongamento por exercícios de flexibilidade, relacionando-se à própria capacidade motora, tal como é na capacidade força, sendo esta desenvolvida ou mantida com os próprios exercícios de força. Neste caso, tem-se força máxima, força de resistência; analogamente ter-se-ia flexibilidade com diferentes níveis de tensão. Mas substituir a palavra alongamento seria um agravante por estar enraizado na área e neste momento seria oportuno evitar neologismo independente de ser especialista e aguardar um posicionamento com especialistas com discussões profundas sobre o assunto.
Similarmente, uma outra proposta seria designar alongamento com baixa tensão, moderada tensão e forte tensão (ACHOUR JUNIOR, 2006), mas esta proposição precisa ser examinada com mais profundidade, porque na prática a tensão muscular seria percebida de forma subjetiva. Até o presente, com maior freqüência, alongamento é considerado um exercício físico que pode manter e/ou desenvolver flexibilidade, referida como uma capacidade motora na qual incidem influências genéticas e ambientais.
Considerações finais
Evidentemente que este artigo não estabelece conclusões definitivas, mas contribui para mostrar as percepções e definições de diferentes autores, disseminando a importância de se estabelecer um posicionamento na área de educação física e esportes com relação aos termos flexibilidade, alongamento, mobilidade e amplitude de movimento. Com mais freqüência, na literatura nacional e internacional, alongamento tem sido destacado como exercício físico e flexibilidade, como a capacidade motora e mobilidade referida como a capacidade articular.
Referências bibliográficas
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Dr.Lucas Nogueira Mendes Ft. Dip Chiro. Fisioterapeuta Quiropraxista pela Anafiq/Coffito. Especialista em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva.
- Dr. Lucas Nogueira Mendes FT,Dip.Quiro
- Araraquara, São Paulo, Brazil
- Graduado em Fisioterapia pela Universidade Paulista. Especialização em Quiropraxia pela ANAFIQ- Associação Nacional de Fisioterapia em Quiropraxia. Pós Graduação em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela Universidade Cidade de São Paulo- UNICID Coordenador do Grupo de Estudos em Postura de Araraquara. –GEP Membro da Associação Nacional de Fisioterapia em Quiropraxia- ANAFIQ/ Membro da Associação Brasileira de Fisioterapia Manipulativa- ABRAFIM/ Membro da Associação Brasileira de Pesquisa em Podoposturologia –ABPQ PODO/ Formação em RPG, SGA, Estabilização Segmentar Lombar e Cervical, Pilates, Podoposturologia, Quiropraxia,Reabilitação Funcional, Kinesyo Tape ,Dry Needling,Mobilização Neurodinâmica, Técnica de Flexão-Distração para Hérnias Lombares e Cervicais. Formação no Método Glide de Terapia Manual. Atualização nas Disfunções de Ombro, Quadril , Joelho e Coluna ( HÉRNIAS DISCAIS LOMBARES E CERVICAIS). ÁREA DE ATUAÇÃO: Diagnóstico cinético-funcional e reabilitação das disfunções musculoesqueléticas decorrentes das desordens da coluna vertebral. AGENDAMENTO DE CONSULTAS PELO TELEFONE 16 3472-2592
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